Como é o ‘modus operandi’ do tráfico de mercúrio descoberto pela PF e Ibama

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Empresas de fachada, documentos falsos e contrabando são parte de um esquema de comércio ilegal de mercúrio, substância fundamental para o garimpo ilegal de ouro no Brasil. Altamente tóxico, o metal é usado como uma espécie de ímã que atrai as partículas de ouro e as separa de impurezas.

Ação conjunta da Polícia Federal e do Ibama desbaratou esta semana um esquema de comércio ilegal da substância. A operação, que recebeu o nome de Hermes II, é desdobramento de uma primeira fase deflagrada em dezembro do ano passado. Foram bloqueados R$ 2,9 bilhões de bens dos investigados e apreendidos 6,5 kg da substância.

“A partir da investigação conjunta do Ibama com a PF, podemos dizer que há fortes evidências de que não há mais disponível mercúrio de origem lícita para ser utilizado na exploração do ouro”, afirma Jair Schmitt, diretor de proteção ambiental do Ibama, em entrevista à Repórter Brasil.

Não há produção de mercúrio no Brasil. Por isso, a substância é importada ou reciclada, obtida normalmente de lâmpadas fluorescentes. Para comercializá-lo, é preciso comunicar o Ibama e declarar sua finalidade, que pode ser a fabricação de cloro, o uso em laboratórios de pesquisas, em consultórios odontológicos, ou no garimpo.

Como o sistema é autodeclaratório, a investigação encontrou ao menos uma empresa de reciclagem que declarou obter uma quantidade superior àquela realmente obtida. Essa quantidade declarada a mais gera um crédito para acobertar o mercúrio que entra no Brasil ilegalmente, como mostra o modus operandi do comércio ilegal da substância revelado pela PF e Ibama.

A investigação identificou uma empresa de fachada, que não tinha nem mesmo os equipamentos necessários para realizar o volume de obtenção de mercúrio que era declarado.

O diretor de proteção ambiental do Ibama explica que o mercúrio ilegal pode entrar no Brasil de várias maneiras, acondicionado em frascos de xampu, e sendo declarado como tal, ou como outro produto, como ferramentas ou halteres de ginástica. Nesse caso, a vantagem — como a de todo produto ilegal — é o preço: custa cerca de R$ 800 o quilo, enquanto o valor da substância legal gira em torno de R$ 1.500 o quilo.

“Quando o mercúrio entra no Brasil ilegalmente, vai parar nessa rede de contrabando que se utiliza desses créditos virtuais da reciclagem de resíduos para esquentar o produto clandestino”, diz Schmitt. Ele explica que a substância é utilizada tanto no garimpo ilegal quanto no legal. E que, muito provavelmente, mesmo nos garimpos legais de ouro, o mercúrio utilizado hoje é contrabandeado. “Neste ano não houve nenhuma emissão de licença para importação de mercúrio para a mineração”, diz.

Depois de ser utilizado no garimpo, os restos de mercúrio costumam ser jogados no rio ou no solo. A contaminação também ocorre durante o processo de queima que separa o mercúrio do ouro, que produz uma fumaça tóxica carregada por quilômetros.

 

Convenção de Minamata

O Brasil é um dos 140 países signatários da Convenção de Minamata, um tratado internacional para o controle e redução do uso do mercúrio. O nome do acordo, proposto em discussões lideradas pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), foi inspirado na cidade japonesa de Minamata, onde a poluição por mercúrio causou sérios danos neurológicos à população, na primeira metade do século XX.

Por isso, o Brasil vem reduzindo o uso legal da substância gradativamente. Empresas que fabricam cloro, por exemplo, terão de suspender o uso do mercúrio totalmente até 2025.

 

Fonte: Repórter Brasil

Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real