Entidades sindicais estão se articulando para intensificar a luta contra a reforma administrativa, que tramita no Congresso Nacional como Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 32 e vem sendo ventilada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), como pauta possível para este semestre legislativo.
Na próxima terça (12), lideranças de entidades representativas do funcionalismo se reúnem com deputados e senadores da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público para consolidar decisões conjuntas e traçar rumos do combate à PEC.
“Teremos essa reunião para tirar uma posição comum entre os representantes da frente e as entidades que estão nesta batalha para que a gente tenha um Estado que de fato atenda à população brasileira, e não dessa forma como eles querem [a PEC 32], que acaba com a estabilidade e abre a porteira para privatizações, terceirizações, contratações de organizações sociais, enfim. Vamos resistir da mesma forma como resistimos em 2021”, afirma o secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), Sérgio Ronaldo.
A PEC 32 teve como autor inicial o governo Bolsonaro, que apresentou o texto ao Congresso em 2020. De lá para cá, a proposta foi aprovada pela Comissão de Constituição & Justiça (CCJ) da Câmara e também por uma comissão especial, tendo sido encaminhada depois ao plenário. A medida conta com alta rejeição popular e por isso empacou nos últimos tempos. O assunto voltou à tona recentemente, por meio de acenos feitos por Lira. Em um recado dirigido ao governo Lula no último dia 21, por exemplo, o presidente da Câmara destacou que a PEC está pronta para ser avaliada pelo plenário e disse que “temos que discutir despesas, já que não podemos aumentar impostos”.
“Esse discurso do Lira é o requentar de uma construção política, econômica que marca a agenda de austeridade que a burguesia impõe contra os trabalhadores e as trabalhadoras e que projeta, sobretudo no serviço público e nos servidores e servidoras, a responsabilidade por um suposto déficit ou inchaço da máquina pública e sua aparente inoperância. Isso é algo terminantemente falso”, afirma o presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), Gustavo Seferian.
A entidade é uma das que são vinculadas ao Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasefe), instância que hoje está em alerta contra um eventual retorno da PEC 32. “O indicativo colocado é de que a sinalização de luta inclua uma série de ações e mobilizações que devem ser confabuladas a partir de uma plenária nacional do funcionalismo público no próximo dia 16. Parece ser esse o espaço político mais qualificado de articulação e unidade de ação do conjunto dos servidores públicos para se fazerem enfrentamentos mais significativos”, diz Seferian.
Nos últimos meses, entidades se uniram e pediram ao governo Lula que retirasse a PEC 32 da Câmara, uma vez que o texto é de iniciativa do Poder Executivo. Mas o grupo esbarrou em um problema não vislumbrado antes: como já teve relatório aprovado em comissão, a proposta agora está nas mãos do Legislativo, não dependendo somente da gestão Lula para ser retirada de tramitação. O regramento vigente estipula que, em casos como esse, é preciso apresentar um requerimento ao plenário pedindo a retirada do texto para que o conjunto dos deputados decida sobre o assunto.
A iniciativa seria uma aventura arriscada, pois poderia atiçar a base pró-PEC 32 e eventualmente antecipar uma avaliação de mérito da proposta, como Lira defende que seja feito. Por conta disso, o assunto acabou pausado. “Há uma leitura de que o Lira hoje não tem os votos necessários para colocar o texto em votação no plenário porque senão já teria colocado e o governo também disse que não vai levar à votação [um pedido dessa natureza] para não ter desgaste. Acho que vai ficar lá em banho-maria”, projeta Sérgio Ronaldo.
Governo
Após as provocações de Lira, o governo Lula se mexeu. A gestão descarta apoio à PEC 32, mas defendeu Projeto de Lei (PL) 2258/2022, que fixa regras gerais para concursos públicos, e a pauta de limitação de supersalários no serviço público. O recado veio por meio do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), que na terça-feira (5) citou o PL 6726/2016. O texto estipula teto para remunerações e subsídios de ocupantes de funções, cargos e empregos públicos.
Estima-se que a medida resultaria em uma economia de R$ 2,3 bilhões, incluindo os três níveis federativos. A iniciativa recairia sobre servidores que, por conta de alguns rendimentos extras, ganham acima do teto do funcionalismo, hoje fixado em R$ 41.650,92. O valor corresponde ao salário mensal dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). “Passamos em revista todas as leis que estão em tramitação que tratam do tema da modernização do Estado, que inclui, evidentemente, o funcionalismo e que podem significar um avanço importante”, afirmou o ministro.
Para o Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado (Fonacate), o aceno pode ajudar a segurar a sanha de Arthur Lira em prol da votação da PEC 32.
“Acho que isso diminui um pouco a tensão na medida em que o governo já se reuniu com o presidente da Câmara, já disse que vai encaminhar projetos, já sinalizou pela votação do PL dos supersalários, o que é importante porque supre um pouco a pressão do mercado de se reformar alguma coisa. E, para nós, servidores, é interessante que votem logo isso porque são 2,3% de servidores, a maioria do Judiciário, que recebem acima do teto. Isso precisa ser corrigido”, defende o presidente do Fonacate, Rudinei Marques.
A apreciação da pauta, no entanto, não é consenso entre as organizações representativas de servidores. Para o secretário-geral do Condsef, o momento não seria oportuno para a análise do o PL 6726/2016. Com o Congresso hegemonizado por parlamentares que seguem a agenda de arrocho fiscal sobre a máquina, a entidade teme que a proposta saia deformada após a aprovação final. O texto já foi chancelado pela Câmara e está parado no Senado.
“Se trouxerem esse tema para a ordem do dia, é evidente que vão trazer à tona também a PEC 32. Acho que neste momento o país deveria priorizar a reforma tributária, a colocação do povo no orçamento e focar em colocar os ricos no Imposto de Renda para que sejam devidamente tributados. Colocar essa pauta neste momento abriria uma sintonia com o que o presidente da Câmara está fazendo”, avalia Sérgio Ronaldo.
Fonte: Brasil de Fato
Foto: Sindsep-DF