A violência contra a população LGBTQIA+ e a luta por direitos iguais são duas das principais bandeiras do Dia do Orgulho LGBTQIA+, celebrado todo dia 28 de junho. Nesta data, é reforçada a visibilidade das batalhas diárias enfrentadas por essas pessoas para terem respeito na sociedade. É um dia de luta desconstruir preconceitos e mostrar ao mundo que essa população tem o direito de amar, de trabalhar e de viver em paz, com dignidade.
Ao mesmo tempo em que ao longo dos anos houve uma significativa evolução na naturalização da existência de diferentes orientações sexuais para além da heterossexual, a violência contra as pessoas LGBTQIA+ ainda apresenta números alarmantes.
De acordo com o Dossiê de Mortes e Violências contra LGBTQIA+, com dados levantados pelo Grupo Gay da Bahia, 273 pessoas dessa população morreram, somente em 2022. Foram 228 assassinatos, 30 suicídios e 15 de outras causas. Os números fazem com que o país ainda sejam um dos mais violentos contra LGBTQIA+´s no mundo (veja mais dados abaixo).
Paralelamente, o preconceito cerceia direitos e oportunidades para essas pessoas. No mercado de trabalho, a luta principal é para que todas as pessoas, incluindo todos os segmentos – lésbicas, gays, bissexuais, pessoas trans, não binárias e demais, possam não somente ter acesso ao trabalho em si, mas que tenham sua existência respeitada.
A luta, nesse aspecto é por tratamento justo e respeitoso, contra a discriminação, por uma atuação efetiva das empresas em casos de preconceito, além de realizar ações afirmativas em defesa da diversidade.
Movimento sindical: a CUT atua de forma efetiva por meio de seus sindicatos na defesa de direitos da população LGBTQIA+. A secretária de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara conta que até 2019 já eram mais de 700 acordos firmados por sindicatos em todo o país que incluíram a pauta em suas negociações.
Para que haja avanços reais, ela explica que a luta por direitos individuais como à livre expressão e orientação sexual tem que estar articulada com a luta por direitos trabalhistas.
“Para a CUT é fundamental ter essa conexão. É, na verdade, parte da luta de classes. A população LGBTQIA+, para ter orgulho pleno, precisa ter consciência de que faz parte da classe trabalhadora, tem que ter orgulho de ser trabalhador, que ajuda a construir as riquezas desse país”, ela explica.
Por isso, a atuação sindical na defesa dos direitos para esta população tem se intensificado por meio de negociações, incluindo pautas de combate à discriminação, contra a violência e por igualdade de oportunidades e salários.
Ambiente de trabalho: Uma pesquisa realizada pela plataforma Infojobs, divulgada em novembro de 2021 mostra que 95% dos entrevistados afirmaram que há preconceito velado nas empresas; 67,3% já sofreram algum tipo de preconceito durantes os processos seletivos por conta da orientação sexual; e 57,6% acreditam que iniciativas de diversidade e inclusão soam apenas como “discurso de marketing”.
Origens
Tanto a violência física como o preconceito – velado ou explícito – na sociedade e no mundo do trabalho são elementos que tiveram durante os últimos anos, um recrudescimento, originado no discurso de ódio propagado pela extrema direita no país – um movimento fascista que tentou silenciar vozes e jogar novamente aos guetos a população LGBTQIA+.
Mas a “virada de jogo” veio com a eleição de um governo progressista em 2022. Políticas e ações que haviam sido destruídas nos governos passados estão sendo retomadas, o que, de acordo com o professor Valmir Siqueira, coordenador do Coletivo Nacional LGBTQIA+ da CUT, representa uma grande esperança para que a sociedade volte a avançar no combate à LGBTQIA+fobia e na garantia de direitos para essas pessoas.
“Hoje a gente está em período de esperança. Tivemos um governo anterior que não só incentivou como como apoiou e tratou como se fosse natural não permitir que as pessoas LGBTQIA+ tivessem seus direitos atendidos. Ele incentivou a criminalização dessas pessoas”, afirma Valmir Siqueira.
A esperança, ele diz, vem de iniciativas como a reinauguração do chamado Conselhão que que reúne diversas entidades e ministérios que discutem e articulam políticas públicas em temas sociais, incluindo a pauta LGBTQIA+.
“Temos hoje até um órgão específico. Foi criada a Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, coordenada por uma travesti, a Simmy Larrat. E temos o Conselho Nacional dos Direitos das Pessoas LGTQIA+, criado agora em abril que é presidido por uma mulher negra, lésbica, a Janaina Oliveira”, diz Valmir se referindo à importância da representatividade em espaços de poder.
No entanto, ele reforça, apesar de vivermos sob um governo cujo olhar social contempla as populações minorizadas, no sentido de proteger e promover cidadania, Valmir reforça que em outros espaços de poder e em setores da sociedade, o conservadorismo e os traços fascistas da extrema direita ainda são presente e continuam resultando em violência contra essa população.
“Não podemos deixar de lutar nunca”, ele diz.
Sociedade
Jandyra Uheara reforça a ideia de que apenas um governo não resolve sozinho toso os problemas. O cerne da questão está em outras instâncias, ela diz.
“O governo tem que atuar, mas precisamos avançar muito no debate com a sociedade, em especial a classe trabalhadora. Não é um problema que o governo vai resolver se não avançarmos em uma concepção de sociedade justa, inclusiva e igualitária”, ela explica, afirmando que instrumentos legais já existem, mas cabe aos trabalhadores ter conscientização política e fazer disputa do modelo de sociedade que ela cita.
Jandyra vai além e afirma que não haverá respeito enquanto houver qualquer traço de violência e discriminação não somente a LGBTQIA+´s mas também a outros segmentos minorizados como a população negra, as mulheres e outros.
Luta pela vida
“É inacreditável que estejamos no Século XXI, em pleno 2023, discutindo ainda a possibilidade de vida. O Estado tem que garantir que garantir a nossa proteção e a gente está ainda lutando ainda para viver”. É desta forma que o coordenador do Coletivo LGBQTIA+ da CUT ressalta que a luta, apesar de novos tempos na condução do país, deve continuar.
Ele se refere não somente a conservadores em espaços de poder, como casas legislativas e até no judiciário, mas à sociedade que ainda preserva conceitos retrógrados que relegam à população LGBQTIA+ pechas difamatórias e depreciativas em relação a existência enquanto condição humana.
“Preconceituosos defendem que Estado não deve ter políticas para nós. Na verdade, não estamos discutindo tutela do Estado. Não é favor o que queremos, não queremos exclusividade na garantia de direitos, mas sim a liberdade de todos. O direito a ter direitos, o direito de se relacionar, de viver. Estamos discutindo a democracia plena”, diz Valmir Siqueira
Em exemplos práticos e simples, tais direitos passam pela garantia de poder ter parceiros em planos de saúde, como dependentes, comunhão de bens, pensão alimentícia, etc. São direitos que já existem, mas precisam ser reconhecidos pela sociedade como um todo.
Por outro lado, ele relembra, o país deu importantes passos na questão da representação política nas eleições 2022. “Hoje temos LGBQTIA+ em governos estaduais, no Senado, na Câmara Federal, nas câmaras municipais e em assembleias legislativas, ele diz.
Orgulho LGBTQIA+
O principal objetivo das lutas e também dos sonhos de cada um é que a sociedade não enxergue a orientação sexual ou de gênero como fator predeterminante do indivíduo ou que classifique pessoas a partir dessas características. E o futuro, ainda que a passos lentos, caminha para isso, de acordo Valmir.
“Paralelamente à politicas governamental, às políticas públicas de garantia de direitos que estamos reconquistando, temos o começo de uma mudança de olhar da sociedade para caminharmos para uam situação em que a orientação sexual da pessoa não seja fator a de classificação do ser humano. Temos que ter em mente o olhar para as pessoas pelo seu caráter, pelos valores humanos e não pela sexualidade”, ele diz.
Sinal dos tempos.
É inegável que uma nova geração, com olhar mais aberto, menos preconceituoso tem semeado a mudança de paradigmas. De acordo com uma pesquisa recente do Instituo Gallup, a maioria dos jovens da chamada Geração Z (nascidos entre 1997 e 2002, são LGBQTIA+.
A mesma pesquisa aponta que a característica principal desta geração é uma maior segurança em expressar sua sexualidade, além de entender e conviver com as demais sem guardar preconceitos.
Já na geração ‘mileninium’, nascidos entre 1981 e 1996, o número cai para 9,1% e nas gerações mais antigas para apenas 2%.
Violência
A pesquisa citada acima, identificou diversos tipos de violência a LGBTQIA+. São agressões físicas e verbais, recusa de prestação de serviços e tentativas de homicídio.
A maioria foram homicídios (228), representando 83,52% do total. Houve ainda 30 suicídios, (10,99% dos casos) e outras 15 mortes (5,49% dos casos). Todas as mortes se deram nos mais diversos ambientes – público doméstico e trabalho.
O dossiê destaca ainda:
- 159 travestis e mulheres trans mortas
- 97 gays mortos
- 91 vítimas pretas e pardas, 94 brancas
- 91 vítimas entre 20 a 29 anos
- 74 mortes por arma de fogo
- 48 mortes por esfaqueamento,
- 130 mortes em período noturno
- 18 suicídios por pessoas trans
- 118 mortes no Nordeste e 71 no Sudeste
Cartilha de Inclusão e Direitos de Pessoas Trans
Produzida em parceria com o escritório LBS Advogadas e Advogados, que presta assessoria jurídica à CUT, a Cartilha de Inclusão e Direitos de Pessoas Trans já está disponível e traz um vasto material sobre o tema.
O objetivo é promover orientação sobre quais são os direitos das pessoas trans e como efetivá-los no dia a dia de maneira simples e prática, garantindo sua inclusão na vida civil para que tenham mais segurança em exercer seus direitos.
“Ao planejar a publicação, escolhemos por direcioná-la às pessoas trans e travestis, que possuem os direitos da vida civil usualmente limitados pela transfobia institucionalizada, ou seja, pelos entraves da própria máquina da administração pública. Além de sofrer com o preconceito da sociedade, a transfobia institucionalizada não as reconhece pelo seu próprio nome e gênero”, explica o sócio e advogado da LBS, Antonio Megale.
O advogado também reitera que a parceria com a CUT tem por objetivo ampliar a visibilidade e o acesso das pessoas LGBTQIA+ a seus direitos, já que a CUT é a maior central sindical do Brasil e também debate esses assuntos em seu Coletivo Jurídico LGBTQIA+.
Jandyra Uehara, secretária de Direitos Humanos da CUT, reforçou sobre a importância da cartilha para os trabalhadores. “A cartilha tem um papel de conscientização dos trabalhadores muito importante e informa de forma clara e objetiva sobre como buscar atenção jurídica para casos de discriminação por sua orientação sexual. O material irá contribuir para aumentar o entendimento não só das pessoas LGBTQIA+, mas das pessoas de maneira geral, ela é um manual de apoio com informações não só para a não discriminação, mas para o acesso à justiça, em caso onde haja discriminação”, reitera.
Almanaque LGBQTIA+
Produzido em 2021, o material que traz um rico conteúdo que visa ampliar o debate sobre questões importantes como diversidade, preconceito, saúde e trabalho.
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Fonte: CUT Nacional
Foto: Pixabay
Arte: Renata Machado (Sindiserf/RS)