A 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30) chegou ao fim em Belém, no sábado, 22 de novembro, com a aprovação unânime de 195 países ao Pacote de Belém, um conjunto de decisões que marca a fase de execução acelerada do Acordo de Paris. Para o governo brasileiro, a conferência cumpriu seus três objetivos centrais: reforçar o multilateralismo climático, aproximar a agenda das pessoas e ampliar a capacidade de implementação de políticas climáticas.
O presidente Lula classificou o encontro como um “sucesso extraordinário”. O chanceler Mauro Vieira avaliou os resultados como “vitórias significativas”, destacando a triplicação dos fundos de adaptação até 2035 e a formalização de instrumentos voltados à transição justa.
Para a CUT, apesar de terem ficado de fora temas importantes no resultado final, em especial o fim dos combustíveis fósseis, a COP30 marcou uma vitória decisiva da classe trabalhadora e movimentos populares com a aprovação do Mecanismo de Ação de Belém, o BAM (Belém Action Mechanism, na sigla em inglês). “O balanço geral da COP30 é positivo justamente porque a pauta defendida pela classe trabalhadora foi incorporada ao pacote final”, afirmou o o secretário de Relações Internacionais da CUT, Antônio Lisboa.
O dirigente destacou ainda que a mobilização popular e a participação ativa da sociedade civil durante a COP foram decisivas para que o tema da Transição Justa entrasse com força no texto final.
“A mobilização que aconteceu em Belém, especialmente com a participação da sociedade civil e da Cúpula dos Povos, foi fundamental para que a Transição Justa ganhasse sentido para as pessoas. Eu sempre digo: ‘ninguém vai defender aquilo que não sabe o que é. Essa participação ajudou a tornar o tema compreensível e, portanto, defendido’”, afirmou.
“Para nós, trabalhadores, houve algo extremamente importante, que foi a aprovação do mecanismo de Belém sobre transição justa. Isso talvez seja o documento mais importante que tenha saído da COP”, disse Antônio Lisboa.
O BAM
Lisboa ressaltou que o BAM não surgiu isoladamente, mas de um processo liderado pelos trabalhadores em articulação internacional. “Não foi uma criação isolada, mas a CUT, junto com o movimento sindical, teve um papel fundamental porque conseguiu colocar a proposta junto ao governo e aos negociadores oficiais. Foi uma iniciativa do nosso campo que acabou sendo abraçada por todos”, explicou.
A defesa de um Mecanismo de Ação permanente para a Transição Justa foi, o, portanto, articulada pela CUT com o movimento sindical internacional, incluindo a Confederação Sindical Internacional (CSI), a Confederação Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras das Américas (CSA) e organismos como o CAN (International e War on Want).
A aprovação do BAM, como foi apresentado na COP30 se deu durante a Pré-COP Sindical, realizada em Brasília em outubro deste ano. Na ocasião foi divulgado o documento “Sindicatos por uma Transição Justa”, manifesto que reforçava a necessidade de integrar ação climática, Transição Justa e trabalho decente, além de apontar a falta de investimentos e denunciar a precarização do trabalho.
Pelo documento, o movimento sindical defendia que a COP30 avançasse na implementação da Transição Justa, na criação do Mecanismo de Ação de Belém (BAM), além do aumento do financiamento para adaptação e mitigação, no fim dos subsídios aos fósseis e no fortalecimento do Plano de Ação de Gênero, diante dos impactos desiguais da crise climática.
“Ali nós aprovamos a proposta do mecanismo. Depois isso virou uma agenda estratégica da sociedade civil e foi muito comemorado. E o resultado acabou sendo melhor do que eu esperava. A transição justa, que é central para nós trabalhadores, entrou de forma consistente no documento final”, avaliou.
Outros temas
Lisboa reconhece também outros avanços setoriais da conferência. “Claro que não tratamos só da transição justa. Há toda a discussão sobre fósseis, financiamento, adaptação. Tudo isso também avançou razoavelmente. Mas, considerando o conjunto, vale a pena destacar o BAM como um avanço importante”, completou.
Ele ainda alertou que ainda há muito trabalho a ser feito, e a realização da COP31 na Turquia tende a tornar o ambiente político mais desafiador para o movimento sindical e a defesa dos direitos de trabalhadores e trabalhadoras.
COP30: resultados
Entre os principais resultados técnicos, o Pacote de Belém estabelece o compromisso de triplicar os recursos globais para adaptação até 2035. O avanço é considerado essencial para apoiar países vulneráveis, onde os efeitos climáticos já são vividos diariamente.
A conferência também concluiu um marco inédito: 59 indicadores voluntários para monitorar o progresso da Meta Global de Adaptação. Os indicadores abrangem saúde, água, segurança alimentar, ecossistemas, cidades, infraestrutura e meios de subsistência, incorporando dimensões transversais como financiamento, tecnologia e atendimento às populações mais expostas.
Outro resultado importante foi o encerramento do Roteiro de Adaptação de Baku, estabelecendo linhas de trabalho para o período 2026–2028.
Fósseis: debate avança, consenso não
A presidência brasileira conduziu um debate político global sobre o futuro dos combustíveis fósseis. Embora não tenha sido possível obter consenso sobre um roteiro para a eliminação progressiva dessas fontes, mais de 80 países aderiram à proposta de iniciar a preparação de um Mapa do Caminho para uma transição justa, ordenada e equitativa.
O Brasil anunciou que vai elaborar um centro de referência para esse processo, além de um Mapa do Caminho específico para interromper e reverter o desmatamento.
Segundo o presidente Lula, é necessário “dar uma solução para a responsabilidade dos combustíveis fósseis por mais de 80% das emissões globais”.
Povos indígenas, justiça social e gênero
A conferência teve participação recorde de mais de 900 representantes indígenas na Zona Azul. As Partes reforçaram o compromisso com a proteção de comunidades tradicionais e afrodescendentes dentro da agenda climática.
Também foi renovado o Plano de Ação de Gênero, ampliando financiamento sensível a gênero, participação de mulheres e diretrizes para implementação climática que considerem desigualdades estruturais.
Ferramentas para acelerar a implementação
A COP30 lançou mecanismos inéditos sob a chamada Decisão Mutirão, que convoca esforços cooperativos globais. Entre eles:
- Acelerador Global de Implementação, voltado a apoiar países na execução de NDCs e planos nacionais;
- FINI (Fostering Investible National Implementation), que busca destravar USD 1 trilhão em projetos de adaptação nos próximos três anos;
- Plano de Ação de Saúde de Belém, endossado por mais de 30 países, com USD 300 milhões para fortalecer sistemas de saúde resilientes ao clima.
O Brasil manterá a presidência do processo até novembro de 2026.
O que é o BAM (Mecanismo de Ação de Belém)
O Mecanismo de Ação de Belém (BAM), proposto por sindicatos e organizações da sociedade civil, representa um marco histórico na governança climática. Seu propósito é transformar a Transição Justa em um componente permanente, financiado e monitorável dentro da UNFCCC, garantindo que direitos trabalhistas, proteção social, trabalho decente, igualdade de gênero e a economia do cuidado façam parte estruturante da ação climática.
O BAM deve:
- Coordenar políticas de Transição Justa dentro da UNFCCC, identificando lacunas e alinhando iniciativas às Diretrizes da OIT;
- Atuar como centro global de intercâmbio de conhecimento, ampliando o atual Programa de Trabalho sobre Transição Justa;
- Oferecer apoio técnico e financeiro a países, incluindo helpdesk, transferência de tecnologia e articulação com financiadores, sem gerar endividamento;
- Garantir que direitos trabalhistas sejam parte da governança climática, reconhecendo que trabalho decente e proteção social são condições para ação climática eficaz.
Seu desenvolvimento continuará até a COP31, com previsão de incluir representação formal de sindicatos e outros grupos observadores.
Para o movimento sindical internacional, o BAM é a interface que articula o Acordo de Paris (metas climáticas) com a Transição Justa (direitos e proteção aos trabalhadores).
Fonte: CUT Nacional
Foto: TANIA REGO/AGÊNCIA BRASIL