Média salarial dos servidores federais mostra que é falsa a narrativa de privilégio

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Quando se fala em servidor público, o imaginário coletivo ainda associa o termo a carreiras de altos salários e estabilidade. Mas os dados mostram outra realidade. Segundo o levantamento ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) os servidores federais representam apenas 10% dos vínculos públicos no país, e sua remuneração média é de R$ 6.330, muito distante da ideia de “privilégio generalizado”.

“O que acontece é que o debate público mistura tudo. A exceção se torna regra. Quando alguém cita os salários de juízes, procuradores ou auditores, cria-se a impressão de que todo o serviço público é assim, e isso simplesmente não é verdade”, explica Félix Lopez, analista do Ipea.

De acordo com ele, as carreiras de elite, que aparecem nas manchetes e nas planilhas de cortes orçamentários, compõem uma minoria dentro da minoria.

“A grande parte do funcionalismo federal está em cargos administrativos, técnicos e de apoio, com rendimentos que giram entre R$ 3 mil e R$ 7 mil. Isso é o grosso do serviço público federal.”

Para Sérgio Ronaldo da Silva, secretário-geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef/Fenadsef), filiada à CUT e que representa 80% dos servidores do Executivo Federal, a reforma administrativa é a maior cortina de fumaça do país. “Os defensores da proposta falam em modernização, mas o que ela entrega é precarização e desmonte do Estado que atende o povo”, pontua.

“Quando Hugo Motta, Pedro Paulo, Zé Trovão e companhia defendem essa PEC 3Oitão (PEC 38/25), como estamos chamando, não estão atacando privilégios — estão apenas garantindo que a conta continue caindo sobre quem recebe R$ 3 mil a R$ 7 mil no serviço público”, prossegue Sérgio, se referindo ao presidente da Câmara e aos deputados de direita que apresentaram o projeto.

 

Reestruturação desigual

Nos últimos anos, o funcionalismo federal passou por fortes restrições de reajuste e concursos, ao mesmo tempo em que as reformas administrativas e fiscais foram construídas sob o argumento de “cortar privilégios”. Para o analista do Ipea a consequência foi o oposto:

“Os cortes lineares e os congelamentos não atingem as carreiras de topo da mesma forma. Na prática, penalizam quem tem menor remuneração e interrompem a reposição de quadros técnicos essenciais”.

A defasagem salarial entre diferentes órgãos da União é um exemplo. Cargos similares, com exigência de escolaridade equivalente, podem ter remunerações que variam até 80% entre ministérios ou autarquias. “Isso mostra como o sistema federal é fragmentado e hierarquizado. Há um topo muito restrito com altos salários, e uma base ampla que vive sob arrocho e perda de poder aquisitivo”, diz Félix.

O assessor do Ipea também aponta o impacto das políticas de austeridade sobre a capacidade operacional do Estado. “Nos últimos dez anos, mais de 50 mil servidores deixaram o quadro da União, e as reposições foram mínimas. Isso afeta diretamente áreas como fiscalização, controle ambiental, educação e pesquisa. O Estado perde braços, e a população perde serviço.”

Já o secretário-geral da Condsef/Fenadsef emenda que os ataques constantes, que têm como resultado o desmonte do setor público, bem como a ausência de valorização dos servidores do Executivo e das carreiras que atendem diretamente à população revelam uma metodologia. “O que está em jogo para esses que atacam os serviços público é abrir espaço para a privatização de direitos e a deterioração deliberada dos serviços essenciais”, diz Sérgio Ronaldo.

 

O mito do privilégio

A insistência em tratar o funcionalismo federal como um bloco homogêneo alimenta o mito do privilégio. “Essa narrativa é conveniente porque desvia o foco do verdadeiro problema, que é a desigualdade interna e a falta de política de valorização. É mais fácil culpar o servidor do que discutir a estrutura tributária ou os subsídios ao setor privado”, afirma Félix.

Ele lembra que, mesmo dentro da União, a maioria dos vínculos está concentrada em áreas finalísticas e de atendimento. “Os servidores do INSS, das universidades federais, dos institutos de pesquisa e dos ministérios técnicos têm remunerações médias”.

Segundo o levantamento do Ipea, metade dos servidores ganha menos do que a média salarial do funcionalismo federal. Os servidores estaduais ganham em média R$ 4 mil e os municipais R$ 2,6 mil.

“Quando a gente fala em ‘média salarial alta’, precisa olhar a distribuição. Uma pequena parcela puxa a média para cima, mas o que o servidor comum leva para casa está muito abaixo do que se imagina”, pontua Félix.

Já o secretário-Geral da Condsef/ Fenadsef destaca que os que chamam o servidor comum de privilegiados ignoram os fatos e dados trazidos à luz pelo Ipea: metade ganha abaixo da média e está longe dos salários que estampam as manchetes. “A narrativa da reforma é perversa porque transforma exceções em regra para justificar cortes que desmontam universidades, INSS, fiscalização e pesquisa”.

 

A importância do serviço federal

Apesar de representar apenas 10% do total de vínculos, o funcionalismo federal é o eixo de políticas estruturantes: previdência, fiscalização, universidades, controle sanitário, regulação econômica e diplomacia. “É o corpo técnico que garante que as políticas nacionais funcionem. Não é um luxo; é uma necessidade do Estado brasileiro”, afirma Félix. Ele ressalta ainda que o desmonte das carreiras médias e técnicas traz um custo social elevado.

“A ausência de concursos e o congelamento de salários desestimulam profissionais qualificados. Isso gera um círculo vicioso: o Estado perde capacidade, os serviços se deterioram, e isso retroalimenta o discurso de que o serviço público é ineficiente. É uma armadilha”.

 

A falsa equivalência

Félix enfatiza que o erro central das reformas é tratar todos os níveis e realidades como se fossem equivalentes. “O que vale para o topo das carreiras jurídicas ou de controle não pode ser aplicado mecanicamente ao conjunto do funcionalismo. O problema é que as políticas vêm padronizadas, e quem paga o preço são os servidores da base”.

Para ele, é necessário reequilibrar a narrativa. “Quando falamos em serviço público federal, precisamos distinguir entre as carreiras típicas de Estado e as de execução direta das políticas. Sem isso, toda a discussão sobre eficiência e gasto público fica distorcida”.

O analista do Ipea conclui: “Não há privilégio sistêmico no funcionalismo federal. O que existe é desigualdade e desvalorização. Usar o topo da pirâmide como referência para justificar cortes lineares é um equívoco técnico e político. O resultado é o enfraquecimento do Estado e o prejuízo à sociedade”.

O secretário-Geral da Condsef destaca que não é preciso aprovar uma PEC para melhorar a gestão e promover reformas eficientes no setor público, e o Congresso sabe disso. “Se insistem nesse caminho, é porque o objetivo é outro e nada tem a ver com servir ao povo. Por isso, quem defende essa reforma administrativa (PEC 38/25), no fundo, defende um Brasil onde serviços públicos viram mercadorias e onde o povo paga pelo que hoje são direitos essenciais assegurados na Constituição. Não é por acaso este está sendo chamado de o Congresso inimigo do povo”

Para Sergio Ronaldo, a narrativa dessa reforma é perversa, entre outros pontos, porque transforma exceções em regra para justificar cortes que desmontam o Estado brasileiro. “É por isso que nossa luta cresce: estamos defendendo o direito da população a um Estado forte, capaz e presente”, conclui.

 

Fonte: CUT Nacional

Foto: CUT